"Mãe com seus filhos"
(William-Adolphe Bouguereau - pintor francês)
“Pela sua maternidade, a mulher não entra apenas na história da vida; suscita a unidade familiar, impõe-se como força misteriosa na vida dos seus e, embora as genealogias antigas fixem o nome dos pais, a memória das mães é que se grava no íntimo”.
Muitas pessoas, coisa ou factos são recordados, ao longo do ano, em dia determinado. Nenhum, porém, atinge a dimensão e o relevo do dia consagrado à mãe.
Velhos e novos, criancinhas mesmo, comemoram esta data com aprazimento geral. E porquê?
Será o sentido da vida em cujo início a mulher ocupa um lugar preponderante e único? Voltarão à lembrança os inúmeros e desmedidos cuidados de que fomos objecto ao longo do nosso viver, sobretudo nos primeiros anos de existência? Teremos presentes os imensos sacrifícios, por vezes, bem dolorosos que as mães fizeram por nós?
Seja como for, mesmo o dia do Pai não impressiona tão profundamente, o coração dos humanos, embora todos saibamos quanto os progenitores se interessam e trabalham pela família.
Mas a ternura, o carinho, o aconchego das crianças, normalmente, pertencem à sensibilidade e doçura femininas e calam mais fundamente no coração dos pequeninos que jamais esquecem tamanhas provas de amor e afecto.
Além disso, na idade da busca de independência, quando o jovem nem a si próprio se compreende, a delicadeza materna encontra sempre meios de apaziguar e compor os melindres e ressentimentos, equilibrando as revoltas interiores e os relacionamentos externos. No coração das mães há sempre um lugar de compreensão mesmo quando a condescendência e a doçura são necessárias.
Pela sua maternidade, a mulher não entra apenas na história da vida; suscita a unidade familiar, impõe-se como força misteriosa na vida dos seus e, embora as genealogias antigas fixem o nome dos pais, a memória das mães é que se grava no íntimo.
Até no mundo antigo, onde se impunha, sobremaneira, a preponderância masculina e quase ficava esquecido o papel da mulher no mundo, o texto sagrado, ao demarcar a conduta humana, não esquece este nome: “Honra pai e mãe” e desdobra-o até nos escritos de profundidade sapiencial: “Quem honra sua mãe é semelhante àquele que acumula um tesouro”, a sugerir que as directrizes do futuro e a felicidade planeada assentam sobre o respeito e amizade dados a quem nos concebeu. Ao mesmo tempo, o sábio, mesmo quando os deveres são difíceis de cumprir, afirma ser a sua observância manancial de alegria e ventura interiores, a derramarem-se na existência: “Por teres suportado os defeitos de tua mãe, ser-te-á dada uma recompensa, a tua casa tornar-se-á próspera na justiça”.
Olhando para o futuro e para a possível realidade desta terra, pois o dia da mãe não é comemorado apenas para fazer a festa e tudo acabar de imediato, já o mestre da vida aconselha o apreço e a estima continuados, mesmo quando tudo se torna mais laborioso: “Não desprezes a tua mãe, quando envelhecer”.
A memória da mãe ou a sua presença enche-nos de contentamento, porque, embora possa ser menos bonita, ela possui um encanto único e aprazível, a deliciar-nos interiormente.
Daí a beleza consagrada da figura materna, já que belo é quanto nos agrada e satisfaz o nosso apetite. Ora a face mais olhada por nós, aquela que permanece dentro do coração como protótipo, através do qual recebemos a formosura feminina, é certamente a da mãe. Além disso, se as pessoas simpáticas nos atraem pelas suas qualidades ou jeitos, os familiares das nossas relações mais profundas permanecem dentro de nós em lugar mais afectuoso e notável.
O nome de mãe surge assim envolto no nosso próprio ser e existir, numa relação sem-par, porque emergente da realidade existencial de nós mesmos.
Que admirar a alegria do dia da mãe, se nos revemos no seu rosto?
Texto: Cunha Sério