quinta-feira, julho 17, 2008

Havia um homem que corria...

Havia um homem que corria pelo orvalho dentro.
O orvalho de muita manhã.

Corria de noite, como no meio da alegria,

pelo orvalho parado da noite.
Luzia no orvalho. Levava uma flecha

pelo orvalho dentro, como se estivesse a ser caçado

loucamente

por um caçador de que nada sabia.

E era pelo orvalho dentro.

Brilhava.


(...)


Pelo orvalho dentro.

De dia. De noite.
A sua cara batia nas candeias.

Batia nas coisas gerais da manhã.
Havia um homem que ia admiravelmente perseguido.

Tomava alegria no pensamento
Do orvalho. Corria.


(...)

- como no meio do orvalho o amor é total.

Havia um homem que ficou deitado

com uma flecha na fantasia.

A sua água era antiga. Estava

tão morto que vivia unicamente.

Dentro dele batiam as portas, e ele corria

pelas portas dentro, de dia, de noite.

Passava para todos os corpos.

Como em alegria, batia nos olhos das ervas

que fixam estas coisas puras.

Renascia.



Herberto Helder - "Elegia Múltipla, III"
in "Ou o Poema Contínuo"

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